A Justiça do Rio de Janeiro manteve a condenação da farmacêutica AstraZeneca ao pagamento de R$ 3,75 milhões por danos morais à família de uma promotora de Justiça que morreu em decorrência de complicações após receber uma dose da vacina Oxford/AstraZeneca contra a covid-19, em 2021.
A decisão foi proferida por unanimidade pela 3ª Câmara de Direito Privado do Tribunal de Justiça do Rio de Janeiro (TJ-RJ) e teve como relatora a desembargadora Marianna Fux, filha do ministro do Supremo Tribunal Federal Luiz Fux.
A promotora, de 35 anos, estava no segundo trimestre da gravidez quando foi vacinada em Niterói (RJ), em maio de 2021. Naquele momento, o Ministério da Saúde ainda não havia incluído contraindicações formais sobre o uso do imunizante em gestantes.
Poucos dias após a aplicação da vacina, ela foi internada com dores abdominais e diagnosticada com trombose venosa profunda e trombocitopenia. Apesar dos esforços médicos, evoluiu para morte cerebral e faleceu em junho daquele ano. O bebê também não sobreviveu.
A ação judicial foi movida pelos pais e pelo irmão da vítima, que alegaram falha da empresa no dever de informar adequadamente os riscos associados à vacina. De acordo com o TJ-RJ, embora a bula mencionasse possíveis efeitos adversos, faltou uma comunicação acessível e eficaz à população.
“Não há, assim, nos autos, prova de que na data da vacinação havia sido dada publicidade suficiente à reação adversa (síndrome de trombose com trombocitopenia), em cristalina violação ao dever de informação qualificado do fabricante.”
Desembargadora Marianna Fux
“O fabricante deve divulgar nos meios de comunicação o aumento da periculosidade do medicamento ou vacina.”
Desembargadora Marianna Fux
Na primeira instância, a AstraZeneca havia sido condenada ao pagamento de R$ 1,1 milhão por danos morais. A empresa recorreu, alegando ausência de comprovação do nexo causal e contestando a aplicação do Código de Defesa do Consumidor (CDC), por se tratar de vacina gratuita oferecida pelo SUS.
Contudo, o TJ-RJ manteve o entendimento de que, mesmo com distribuição gratuita, a farmacêutica integra a cadeia de consumo e, portanto, responde nos termos do CDC.
O colegiado decidiu majorar a indenização: R$ 1,5 milhão para cada um dos pais da vítima e R$ 750 mil para o irmão, totalizando os R$ 3,75 milhões.
O acórdão também manteve a aplicação de multa de 20% sobre o valor da causa por ato atentatório à dignidade da Justiça, devido à postura da empresa durante a fase de produção de provas.
“Criando embaraço ao cumprimento de comando judicial, isto é, à efetiva conclusão das perícias.”
Trecho do acórdão
A AstraZeneca ainda apresentou embargos de declaração, argumentando omissões e obscuridades no julgamento anterior. Todos os argumentos foram rejeitados.
“Inexistem omissão, obscuridade ou contradição no julgado, tratando-se a presente irresignação de mero inconformismo com o decidido.”
Desembargadora Marianna Fux
Durante o voto, a relatora ressaltou que a responsabilidade da fabricante vai além da bula, exigindo a comunicação ampla de riscos emergentes. Segundo ela, países como Dinamarca e Noruega já haviam suspendido o uso da vacina por episódios semelhantes antes da vacinação da promotora.
A magistrada reforçou ainda que, para o Judiciário, a dor dos familiares é presumida e independe de comprovação específica. O acórdão afirma que:
“O sofrimento dos genitores é patente e inegável, dispensando maiores explanações.”
Trecho da decisão
“O irmão foi privado do convívio fraterno e com seu sobrinho falecido ainda no ventre.”
Trecho da decisão
Com a nova decisão, a condenação da AstraZeneca permanece válida e sem possibilidade de alteração no âmbito do TJ-RJ.